Investigadores em Curitiba e em Brasília encontraram indícios de um esquema de caixa 2 e tráfico de influência no exterior formado por Lula, Odebrecht e o marqueteiro do PT
THIAGO BRONZATTO E FILIPE COUTINHO
Às 10h30 da terça-feira passada, o publicitário João Santana e sua mulher, Mônica Moura, embarcaram num King Air, em Guarulhos, São Paulo, rumo à carceragem da Polícia Federal em Curitiba. Alvo da Operação Acarajé, a 23ª fase da Lava Jato, o casal estava sereno. Falava de amenidades. Tão logo o avião decolou, Santana avistou um conjunto habitacional. Não resistiu. Gabou-se para os policiais que faziam sua escolta: “Fui eu que criei o nome do programa Minha Casa Minha Vida”. Em seguida, passou a rememorar histórias das campanhas que coordenou no exterior. Orgulhoso, disse que ajudara a reeleger o presidente venezuelano Hugo Chávez, em 2012. Como se protagonizasse uma de suas peças publicitárias, Santana tentava incutir em seus espectadores a tese de que o dinheiro recebido por ele lá fora tinha origem nas eleições que ele coordenara em outros países – e não em propinas da Petrobras, como suspeitam os investigadores da Lava Jato. A encrenca de Santana, porém, é dupla: os investigadores de Curitiba suspeitam, baseados em evidências, que o marqueteiro recebeu dinheiro sujo da Odebrecht pelos dois tipos de serviço. Os que ele fazia aqui, para Lula e Dilma, e os que ele fazia lá fora, para amigos do lulismo.
Na contabilidade dos procuradores, o comando do caixa – do dinheiro – estava com a Odebrecht, segundo as provas obtidas pela Lava Jato. E a Odebrecht tinha interesses e contratos tanto na Petrobras, resultando em pagamentos do petrolão, quanto em obras no exterior, resultando em pagamentos de propina para marqueteiros e agentes públicos estrangeiros. Os executivos da Odebrecht, de acordo com as evidências colhidas no Brasil, nos Estados Unidos e na Suíça, usavam a mesma rede de contas secretas em paraísos fiscais para pagar propina em diferentes esquemas – seja por obras ou campanhas no Brasil, seja por obras ou campanhas no exterior. Segundo os investigadores brasileiros e suíços, um homem detinha o controle final desse caixa único: Marcelo Odebrecht.
A Lava Jato só conseguiu provas para prender João Santana ao investigar essa vasta rede da Odebrecht. Foi nela que osinvestigadores encontraram os indícios de que João Santana e Mônica Moura podem ter recebido dinheiro sujo da Odebrecht e de um dos operadores do petrolão, durante a campanha presidencial de Dilma, em 2014. Ao deparar com essas provas, os procuradores deram-se conta, gradualmente, de que a relação de João Santana com a Odebrecht pode ser mais próxima do que parecia. Essa investigação conflui com outra envolvendo a Odebrecht: a que apura, em Brasília, o tráfico de influência internacional do ex-presidente Lula em favor da Odebrecht. Segundo os procuradores do MPF em Brasília, a Odebrecht pagou R$ 7 milhões a Lula para que ele fizesse tráfico de influência em favor da empreiteira. Usando o prestígio vendido por Lula, de acordo com os mesmos procuradores, a Odebrecht abocanhou contratos em países da América Latina e na África, onde Lula deu as tais “palestras”, e financiamentos generosos do BNDES para tocar as obras.
Para os investigadores, fica cada vez mais claro o papel fundamental do marqueteiro nessa engrenagem. Os presidentes e ex-presidentes da Venezuela, do Panamá, da República Dominicana e de Angola, países em que Lula e Odebrecht atuaram, contaram com os serviços de João Santana em suas campanhas – com ou sem caixa dois. Santana era responsável por eleger os candidatos escolhidos pela Odebrecht – e os investigadores suspeitam que, enquanto a empreiteira usava Lula para costurar seus negócios, o ex-presidente afiançava a empresa e batalhava os milionários empréstimos do BNDES. O interlocutor nesses países era quase sempre um presidente eleito com a ajuda de João Santana, o que garantia à Odebrecht um aliado no poder. Segundo os investigadores que apuram essas conexões, todos saíam ganhando: o marqueteiro, o ex--presidente, os presidentes amigos, a empreiteira.
Os investigadores da Lava Jato, assim como os procuradores de Brasília, já conseguem distinguir, após o acúmulo dessas e outras provas, que o petrolão pode ser parte de um esquema maior e mais complexo de pagamento de propinas. “Os fatos criminosos se misturam, assim como os esquemas”, diz um dos principais responsáveis pela Lava Jato. “Há um grande quadro de corrupção sistêmica, liderado em parte pela Odebrecht, e que não se limitava à Petrobras ou mesmo ao Brasil. Uma mesma organização criminosa, com divisão de tarefas e cometimento rotineiro de crimes.” Para avançar, os procuradores e delegados contam com a colaboração de outros países, especialmente a Suíça e os Estados Unidos, que tocam investigações semelhantes. Foi graças aos investigadores americanos e suíços que os brasileiros tiveram acesso às contas secretas controladas pela Odebrecht, e que bancaram os serviços de marqueteiros como João Santana. Ainda há, por baixo, cerca de US$ 200 milhões em pagamentos atribuídos à Odebrecht em contas secretas, cujos beneficiários ainda não são conhecidos (oficialmente).
A confissão de Mônica
Ao confessar em depoimento à Polícia Federal que recebeu pagamentos em caixa dois pelas campanhas feitas no exterior, Mônica Moura confirmou, no entender dos investigadores, que ela e o marido fazem parte desse “modus operandi criminoso” – para usar uma expressão dos procuradores de Brasília – de tráfico de influência internacional em favor da Odebrecht. A empreiteira, de olho nas licitações nesses países, repassou, por meio da empresa offshore Klienfeld, US$ 3 milhões para contas secretas de Santana fora do Brasil, entre abril de 2012 e março de 2013. No depoimento de Mônica, ela admite, sem titubeios, que a Odebrecht usou caixa dois, “de maneira não contabilizada”, para bancar os custos de US$ 35 milhões da campanha de Hugo Chávez, na Venezuela. Mônica disse que não foi depositado dinheiro no Brasil. Mas ÉPOCA publicou na última sexta-feira em seu site que a Odebrecht pagou R$ 4 milhões para João Santana no Brasil entre outubro e novembro de 2014, quando ele era o marqueteiro da campanha de Dilma Rousseff. Tal dado surgiu numa planilha apreendida pela Polícia Federal na sede da construtora Odebrecht.
Mônica disse que, em 2011, quando o casal fazia a campanha de reeleição de Chávez, ela foi orientada a procurar Fernando Migliaccio, executivo da Odebrecht, preso pelo Ministério Público suíço quando tentava fechar contas bancárias em Genebra. Aquele ano teve, além do pleito na Venezuela, a reeleição de José Eduardo Santos, em Angola, e a eleição de Danilo Medina, na República Dominicana – todos países de interesse comercial da Odebrecht, todas campanhas comandadas por Santana. Mônica confirmou à PF que foi firmado um “contrato fictício” com a offshore Klienfeld, usada pela Odebrecht para pagar propina do petrolão lá fora, e que os valores passados pela empreiteira no exterior para o casal “alcançam aproximadamente R$ 3 a R$ 4 milhões”.
Mônica admitiu ainda que, até 2014, encontrou-se diversas vezes com Migliaccio, em São Paulo, “tanto na sede da empresa quanto em locais públicos”. Essa ligação entre o casal marqueteiro e o executivo da Odebrecht é de extrema importância para a investigação. Era ele quem controlava os “acarajés”, apelido usado pelos envolvidos para se referir à propina, segundo os procuradores. Foi ele quem recebeu e-mails detalhando o pagamento a funcionários públicos da Argentina, onde a Odebrecht mantém contratos. E é ele o autor de uma planilha, apreendida pela PF, que dá a dimensão do esquema internacional da empreiteira. Na tabela, Migliaccio registrou valores repassados a “Feira” – um codinome para João Santana. Alguns exemplos das anotações de Migliaccio: “Evento El Salvador via Feira 5.300”; “Feira (Pagto fora = US$ 10 MM)”; e “Feira (atendido 3,5 MM de Fev a Maio de 2011) Saldo Evento”. Evento, dizem os investigadores, é campanha. Há menção direta nesse documento de repasses “via JD” e “via Feira”, o que, para a polícia, significa claramente “por intermédio de José Dirceu e João Santana”. No documento, também há remissão a pagamentos supostamente para o Partido dos Trabalhadores (“Bônus PT = 900”). O nome da planilha contém a famosa sigla MO – mais um entre tantos indícios de que Marcelo Odebrecht tinha pleno conhecimento dos pagamentos. Somam-se ao título da tabela as anotações do próprio MO em seu celular, apreendido nas buscas realizadas quando ele foi preso, em junho de 2015. No aparelho, Marcelo Odebrecht anota: “Liberar para Feira pois meu pessoal não fica sabendo” e “40 para Vaca (parte para Feira)”, Vaca sendo João Vaccari, ex-tesoureiro do PT também preso na Lava Jato, de acordo com a PF.
A Lava Jato já sabe que, para desvendar todas as operações secretas da Odebrecht no exterior, será preciso fazer uma devassa na vida de Migliaccio, “responsável por gerenciar contas titularizadas por ao menos duas offshores usadas pelo grupo empresarial para o pagamento de vantagens indevidas a agentes públicos ligados à Petrobras: a Construtora Internacional Del Sur e Klienfeld Services.” A Del Sur foi citada por delatores como canal de pagamento de propina da Odebrecht fora do país. A Klienfeld foi a empresa de fachada, também da Odebrecht, responsável pelos pagamentos a João Santana. O MP Suíço confirmou, por meio de extratos bancários, as informações e planilhas dos delatores.
A campanha panamenha
A relação entre João Santana e a Odebrecht chamou a atenção não só da força-¬tarefa da Lava Jato, mas também dos peritos do Ministério Público Federal em Brasília, que investigam o tráfico de influência de Lula. No inquérito sigiloso, investigadores destacaram que o nome de João Santana aparece em telegramas enviados por “diversas embaixadas” brasileiras. O relatório menciona uma correspondência secreta do Itamaraty, emitida em novembro de 2014, do Panamá, e obtida por ÉPOCA. “A Odebrecht era a mais importante contratista do governo do ex-presidente Ricardo Martinelli, tendo, por isso mesmo, maior visibilidade. Ademais, comenta-se que a contratação do marqueteiro João Santana para atuar na campanha do candidato do partido do ex-presidente Martinelli, José Domingo Arias, derrotado pelo atual presidente, teria sido efetuada por indicação da Odebrecht”, diz a mensagem diplomática.
A relação entre João Santana e a Odebrecht chamou a atenção não só da força-¬tarefa da Lava Jato, mas também dos peritos do Ministério Público Federal em Brasília, que investigam o tráfico de influência de Lula. No inquérito sigiloso, investigadores destacaram que o nome de João Santana aparece em telegramas enviados por “diversas embaixadas” brasileiras. O relatório menciona uma correspondência secreta do Itamaraty, emitida em novembro de 2014, do Panamá, e obtida por ÉPOCA. “A Odebrecht era a mais importante contratista do governo do ex-presidente Ricardo Martinelli, tendo, por isso mesmo, maior visibilidade. Ademais, comenta-se que a contratação do marqueteiro João Santana para atuar na campanha do candidato do partido do ex-presidente Martinelli, José Domingo Arias, derrotado pelo atual presidente, teria sido efetuada por indicação da Odebrecht”, diz a mensagem diplomática.
A relação entre João Santana e a Odebrecht chamou a atenção não só da força-¬tarefa da Lava Jato, mas também dos peritos do Ministério Público Federal em Brasília, que investigam o tráfico de influência de Lula. No inquérito sigiloso, investigadores destacaram que o nome de João Santana aparece em telegramas enviados por “diversas embaixadas” brasileiras. O relatório menciona uma correspondência secreta do Itamaraty, emitida em novembro de 2014, do Panamá, e obtida por ÉPOCA. “A Odebrecht era a mais importante contratista do governo do ex-presidente Ricardo Martinelli, tendo, por isso mesmo, maior visibilidade. Ademais, comenta-se que a contratação do marqueteiro João Santana para atuar na campanha do candidato do partido do ex-presidente Martinelli, José Domingo Arias, derrotado pelo atual presidente, teria sido efetuada por indicação da Odebrecht”, diz a mensagem diplomática.
Naquele ano, Santana fez a campanha derrotada de José Domingo Arias, no Panamá, e a de reeleição de Dilma Rousseff por aqui. Foi também em 2014 que o marqueteiro embolsou US$ 3 milhões em transferências feitas pelo operador Zwi Skornicki, acusado de intermediar pagamentos de propinas na Petrobras. No depoimento à PF, Mônica Moura não soube explicar a razão pela qual Skornicki realizou transferências num total de US$ 4,5 milhões para a offshore Shellbill, controlada pelo casal e sediada no Panamá, durante o período de setembro de 2013 a novembro de 2014. Ela disse que o operador foi recomendado por uma mulher do departamento financeiro da campanha presidencial de José Eduardo Santos, em Angola, em 2012, e que acreditava que os pagamentos foram realizados por Skornicki porque ele devia ter interesse em fazer negócios no país africano. A mulher de João Santana também disse que recebeu US$ 50 milhões pela campanha em Angola, sendo US$ 30 milhões a partir de um contrato formal com a Polis Brasil, empresa em que é sócia com o marido, e US$ 20 milhões de um acordo de “gaveta”.
Ela ainda revelou, candidamente, que “em todas as suas campanhas, não fosse por imposição dos contratantes, preferia que fosse tudo contabilizado”. As movimentações financeiras de João Santana em Angola acenderam um sinal de alerta no Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão de inteligência ligado ao Ministério da Fazenda. Foi produzido o relatório 12.609/2014, em 30 de maio de 2014, que aponta uma operação de câmbio atípica proveniente de Angola e realizada em outubro de 2012. O documento gerou uma investigação sobre suspeita de lavagem de dinheiro no MPF na Bahia e, em seguida, na Polícia Federal em São Paulo, conforme revelou o jornal Folha de S.Paulo.
Enquanto João Santana ajudava a eleger os presidentes próximos da Odebrecht no poder, Lula ajudava a construtora a fazer negócios em países como Angola. Um ano antes das eleições no país africano, em junho de 2011, Lula foi contratado pela empreiteira para dar uma palestra em Luanda, capital angolana. Após o evento, Lula se encontrou com o presidente do país, José Eduardo dos Santos, e com Emilio Odebrecht, controlador da empreiteira. Um mês depois, o BNDES abriu seu cofre e liberou um empréstimo de US$ 281 milhões para a Odebrecht construir 3 mil unidades habitacionais e desenvolver uma rede de infraestrutura para 20 mil residências em Angola. José Eduardo dos Santos foi reeleito em 2012 com a ajuda de Santana. Desde então, a Odebrecht conquistou sete contratos com o governo do país africano – e recebeu US$ 1,2 bilhão do BNDES para tocar essas obras. É por sincronias como essa que a força-tarefa da Lava Jato resolveu investigar as conexões entre as diversas frentes de apuração.
Na República Dominicana, ocorreu sincronia semelhante. Em maio de 2012, João Santana elegeu Danilo Medina Sánchez como presidente do país. Naquele mesmo ano, entre abril e julho, a Odebrecht repassou US$ 1,5 milhão para as contas de Santana no exterior. Em janeiro de 2013, Lula viajou, bancado pela Odebrecht, para a República Dominicana, onde se reuniu com Medina. Em julho, o BNDES liberou US$ 114 milhões para dois projetos da Odebrecht no país. Em outubro, a empreiteira venceu uma licitação para construir uma termelétrica na região de Punta Catalina, mesmo apresentando um orçamento superior às concorrentes, que foram desclassificadas por não cumprirem os pré-requisitos. O BNDES financiou o empreendimento com US$ 656 milhões. Antes de ser preso na Lava Jato, João Santana trabalhava na campanha de reeleição de Medina.
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