
EPA/FERNANDO BIZERRA JR
Contaminado pela Lava-Jato, presidente será
incapaz de recuperar economia, acusa a oposição e concorda, em surdina, parte
da sua base. Mas eleições só são possíveis até dia 31
Citado 44 vezes na megadelação premiada por
executivos da construtora Odebrecht, Michel Temer (PMDB) está definitivamente
associado à Operação Lava-Jato desde esta semana. Além disso, o presidente da
República sofreu queda de 20 pontos percentuais na taxa de aprovação que o
coloca a níveis de popularidade "abaixo de Dilma". Finalmente, a
economia, passados cem dias de governo efetivo, não recupera e pode, dado o
somatório de crises, não recuperar enquanto Temer ocupar o Planalto. Somados
estes problemas, a substituição do chefe do Estado volta à agenda política - e,
por motivos de ordem constitucional, com urgência.
Diz a Constituição brasileira que só podem ser
convocadas eleições presidenciais diretas nos dois primeiros anos de mandato.
Temer tomou posse, como vice-presidente de Dilma Rousseff (PT), no primeiro dia
útil de janeiro de 2015, o que implica que os dois primeiros anos desta
legislatura terminam a 31 de dezembro - dentro de 17 dias. A partir daí, o
presidente do Brasil será eleito, de forma indireta, isto é, por votação dos
deputados e dos senadores, a não ser que se votasse uma emenda constitucional.
Na edição de ontem do jornal de maior
circulação do país, o Folha de S. Paulo, dois colunistas abordam o tema.
"Só um presidente com voto pode dar alento à vida nacional. Eleito com
base em ideias para tirar o Brasil do buraco, ele poderá governar de verdade,
abreviando o suplício nacional. Fora, Temer", escreve o jornalista Mário
Sérgio Conti.
O filósofo Hélio Schwartsman, por sua vez, num
texto cujo título é "encalacrados", lembra que, na prática, o caminho
da substituição é difícil. "Nada indica que Temer vá renunciar antes de 31
de dezembro. Mesmo que isso ocorresse, os partidos não estão prontos para um
pleito dentro de poucos meses. Eles não sabem nem mesmo que nomes poderiam
lançar que não corram o risco de ser engolidos por condenações judiciais. Mas
uma renúncia de Temer a partir de 2017, não refrescaria muito as coisas porque
levaria a uma eleição indireta feita por um congresso no qual parlamentares -
fala-se em centenas - estão sob suspeita."
Mas a discussão não se reduz à imprensa. Em
Brasília, além dos pedidos formais de renúncia de Temer, que partem do PT e
restante oposição, nos bastidores do Palácio do Planalto e do Congresso Nacional,
uma alternativa de curto prazo ao presidente começa a ser discutida até pela
base do governo. Nesse caso, dois nomes surgem desde já nos corredores, de
acordo com a colunista do jornal Folha de S. Paulo Mônica Bergamo: o de Nelson
Jobim, 70 anos, cinco a menos do que Temer, e o de Fernando Henrique Cardoso,
85, dez a mais.
Questionado nesse sentido em entrevista ao DN
em outubro, Cardoso, presidente da República de 1994 a 2002, negou: "Desde
que deixei a presidência disse e me dispus a não mais me candidatar a postos
eletivos, acho salutar a alternância, não só de partidos no poder mas de
gerações, e porque haveria eu de me candidatar quando no meu partido há pelo
menos três nomes disponíveis (há até mais...)?" Com os rumores a
aumentarem, o antigo chefe do Estado reafirmou ao jornal O Estado de S. Paulo
que não é candidato. "Qualquer especulação sobre eu poder vir a ser
presidente só vai atrapalhar e diminuir a confiança, ouvi no outro dia o Lula
[ex-presidente, do PT] a dizer que eu estou a trabalhar para ser presidente, é
porque não me conhece, ele é que é candidato permanente, eu não."
Nelson Jobim, por sua vez, é especulado por ter
bom trânsito à direita, à esquerda, e no poder judicial, legislativo e militar.
Foi ministro da Justiça de Fernando Henrique Cardoso, da Defesa nos consulados
dos petistas Lula e Dilma, além de presidente do Supremo Tribunal Federal e
deputado por duas legislaturas.
Entretanto, Temer não se pronunciou sobre a
possibilidade de renúncia. O presidente queixou-se sim em carta ao
procurador-geral da República de que as fugas de informação "das supostas
colaborações premiadas" vêm provocando "interferência" na
condução de políticas públicas acirrando as crises económica e política e
gerando "desconfiança e incerteza", sugerindo, por isso, a anulação
dos depoimentos.
CENÁRIOS
Crise no governo Temer trava a economia e
acelera especulações sobre a saída do presidente
Michel Temer renuncia ao cargo até dia 31
› Se Michel Temer renunciar ao cargo até dia 31
deste mês, como pede declaradamente a oposição e veladamente parte da base de
apoio do governo, serão marcadas eleições presidenciais diretas nos próximos 90
dias. Até lá, Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados citado na
Lava-Jato, assume o governo provisório. Temer, porém, não falou ainda em
renúncia. E a campanha correria paralela às delações dos executivo da Odebrecht
que devem contaminar eventuais candidatos.
Presidente demite-se depois de dia 31
› Caso Temer decida renunciar depois de dia 31
ou o Tribunal Superior Eleitoral resolva anular a sua eleição em 2014, com base
em irregularidades de campanha, é ao Congresso Nacional que compete eleger o
sucessor, porque a Constituição prevê que substituições nos dois últimos anos
de mandato são indiretas. Mas quase metade dos congressistas por já ser ou,
como se espera, vir a ser atingida pelos delatores da Lava-Jato terá
legitimidade de escolha ferida.
Emendar Constituição para ter eleições
› Aprovar uma emenda à Constituição que permita
a realização de eleições mesmo nos dois últimos anos de mandato, no caso em
2017. Dois deputados favoráveis ao impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff
entraram com um pedido de emenda nesse sentido em junho mas que está travada,
alegam Miro Teixeira (Rede) e Espiridião Amin (PP), por pressão do governo.
Para a emenda ser aprovada são necessários os votos de dois terços dos
parlamentares brasileiros.
Temer, do PMDB, fica até outubro de 2018
› Em nome da estabilidade política do Brasil, o
presidente Michel Temer cumpre o mandato até outubro de 2018, quando estão
marcadas novas eleições. Nesse caso, a economia, principal razão da queda da
ex-presidente brasileira Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores, pode
continuar sem dar sinais de recuperação, dada a baixa popularidade do governo e
o envolvimento do seu núcleo de comando com o escândalo de corrupção Lava-Jato.
Em São Paulo
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