Perfis falsos na internet tornaram-se parte da comunicação política e podem influenciar o discurso online, ao inflar discussões sobre um determinado tema, a fim de marginalizar outros pontos de vista.
É comum no Twitter encontrar os chamados bots,
robôs que geram contas falsas e espalham conteúdo em escala industrial. Aquele
novo seguidor que não tem foto de perfil e compartilha uma mensagem aleatória
apenas uma vez ao dia, provavelmente é uma dessas contas automatizadas.
Há os bots para fins comerciais – muito difundidos
na internet –, mas há também aqueles criativos, como o perfil @MagicRealismBot,
programado para gerar, a cada duas horas, pílulas de sabedoria que imitam
citações de escritores famosos como Jorge Luis Borges e Gabriel García Márquez.
A chicken lays an egg. A brain is inside it.— Magic Realism Bot (@MagicRealismBot) 23 de agosto de 2016
O aumento do uso de robôs nas redes sociais tem
aberto uma série de discussões, principalmente quando são utilizados para fins
políticos. Para especialistas ouvidos pela DW, essa prática pode afetar a
credibilidade da internet e até a própria democracia de um país.
Bots políticos podem trabalhar de diferentes
formas: contas falsas são principalmente usadas para amplificar a rede de
seguidores de um determinado político, mas também são capazes de inflar discussões
sobre um determinado tema, a fim de marginalizar outros pontos de vista.
"Já vimos bots discutindo uns com os outros. E
já vimos pessoas reais discutindo com eles", explica o especialista Phil
Howard, professor do Instituto de Internet da Universidade de Oxford, à DW.
Em comparação com outras plataformas sociais, como
o Facebook, os robôs são mais eficazes e mais fáceis de implementar no Twitter
– e é nessa rede social que eles têm sido mais comumente usados para fins
políticos.
Manipulando o debate online
Os bots se tornaram uma ferramenta comum entre
regimes autoritários e ditatoriais, que têm o interesse de manipular as
discussões na internet. Também são empregados em democracias a fim de
influenciar a opinião de cidadãos sobre questões controversas ou para fazer
diferença nas eleições.
México, Turquia e Rússia, por exemplo, são países
amplamente afetados por essa prática. "Os bots são eficazes em semear
confusão ou sufocar uma conversa política sobre uma questão global que envolva
um governo autoritário. Por isso, eles são bastante ativos na Rússia, onde
fazem parte de uma estratégia de sucesso do governo para espalhar a
desinformação", diz Howard.
Políticos brasileiros
A pedido da DW, o especialista em redes sociais
Torsten Müller analisou as contas no Twitter do presidente interino Michel
Temer e da presidente afastada Dilma Rousseff. O teste usou a ferramenta
Twitter Audit, software capaz de avaliar quem são os seguidores reais e os
falsos dentro de um perfil.
Na conta de Temer (@MichelTemer), 78% foram
detectados como sendo perfis reais. Entre os quase 613 mil seguidores, 132.962
seriam falsos e 479.766, reais.
Já no perfil de Dilma (@dilmabr), o resultado é um
pouco pior: 71% dos usuários que a seguem seriam pessoas de verdade. Ou seja,
entre os 4,8 milhões de seguidores da presidente afastada, 1.406.220 seriam
falsos e 3.409.603, reais. O Twitter Audit alerta que a pesquisa contém margem
de erro. Müller explica que contas inativas ou com pouco uso podem ser contadas
como falsas.
Perfis falsos e bots muitas vezes vêm de locais
conhecidos como click farms, fazendas de cliques onde pessoas trabalham criando
perfis falsos e aumentando a popularidade de clientes. Índia, Arábia Saudita e
Madagascar são alguns dos locais conhecidos por abrigarem click farms.
O especialista acredita que o uso de bots é mais
comum do que os políticos querem admitir. "Com mais seguidores, as pessoas
vão achar que você tem mais influência. Mas os bots também vão ajudar a
espalhar o seu conteúdo. Eles vão te retweetar, por exemplo. Então, é uma
ferramenta que muita gente usa, inclusive partidos políticos", afirma ele.
Perigo para a democracia?
Os algoritmos das redes sociais que definem o que
aparece na timeline de cada usuário dão preferência a temas que estão sendo
comentados por muitas pessoas. Por isso, os bots têm o papel de criar um efeito
de manada dentro da internet e, assim, influenciar a opinião pública.
"Algumas vezes basta uma simples fagulha e,
por meio dos bots, a coisa se espalha por todo o mundo. E isso pode colocar em
risco a democracia", opina o especialista em marketing digital Hendrik
Unger. "Por isso, os administradores das redes sociais devem cuidar para
que os robôs, por meio de medidas de segurança, sejam completamente
bloqueados."
Unger estima que a quantidade de bots nas redes
sociais varia de 10% a 30%, dependendo da plataforma. "O que algumas vezes
notamos em páginas de Facebook ou de Instagram de famosos, como a do cantor pop
Justin Bieber, é uma queda súbita na quantidade de fãs e seguidores. De repente,
elas têm meio milhão de fãs a menos. E isso acontece quando os administradores
de redes sociais fazem uma limpeza e apagam todas as contas falsas
detectadas", explica.
O especialista ainda alerta que o uso de bots é uma
praga na internet, mas que só traz efeitos de curto prazo. "É realmente
como o doping: os meus músculos crescem e eu fico bombado, super forte, mas não
dura muito tempo", avalia. Ele acredita que a compra de cliques é
arriscada, podendo gerar danos à imagem de empresas e políticos e resultar na
perda de confiança.
Convivendo com os robôs
Já Saiph Savage, cientista da computação da
Universidade de West Virginia, não está muito preocupada com a ameaça dos robôs
na internet. "Eu acho que é muito provável que nós, como sociedade, iremos
estabelecer normas sobre quais tipos de bots são inofensivos para uso – e quais
não", diz Savage. "Por exemplo, se um candidato é flagrado com um
exército de robôs, isso é algo que a sociedade vai punir."
Por outro lado, os políticos que usam bots de uma
forma mais sofisticada, a fim de se comunicarem melhor com seu eleitorado,
poderiam muito bem ser recompensados, acrescenta ela. "É tudo uma questão
de usar a mídia social para permitir colaborações entre os candidatos e os
cidadãos", opina.
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