JOÃO RUELA RIBEIRO
Em poucos dias, as forças que combatem os jihadistas conseguiram entrar em Sirte e cortar a principal ligação do “califado” à Turquia.
O autoproclamado Estado Islâmico (EI) conheceu nos últimos dias duas grandes derrotas na Líbia e na Síria, que se somam à perda parcial de Falluja no Iraque na semana passada.
As forças pró-governo de unidade na Líbia lançaram uma ofensiva na sexta-feira para tomar a cidade portuária de Sirte. Durante a semana, as posições do Estado Islâmico foram bombardeadas por raides aéreos e por mísseis, até que as forças terrestres decidiram avançar para o centro da cidade.
Um porta-voz das forças alinhadas com o governo de unidade reconhecido pela ONU dizia este sábado à BBC que a presença do Estado Islâmico em Sirte estava enfraquecida, mas “não totalmente derrotada”. Os combates concentraram-se nas últimas horas em torno de um antigo centro de conferências que serve agora de quartel-general do grupo jihadista no centro da cidade.
O Estado Islâmico responde aos avanços das forças fiéis ao governo com tiros de snipers a partir dos edifícios que controla. Os combates fizeram 11 mortos e 45 feridos entre os elementos pró-governamentais, revelou à AFP o porta-voz do governo, Reda Issa.
Sirte — uma estratégica cidade portuária 450 quilómetros a leste da capital Tripoli e lugar onde nasceu o antigo líder líbio Muammar Khadafi — é um importante objectivo na luta contra o Estado Islâmico. Desde o final de 2014 que o grupo salafista de inspiração sunita se estabeleceu na Líbia, aproveitando o vazio político deixado após a intervenção militar da NATO para derrubar Khadafi. E Sirte era o seu principal bastião fora da Síria e do Iraque, onde no Verão de 2014 foi estabelecido um “califado”.
Uma vitória das forças pró-governamentais — essencialmente um conjunto de milícias provenientes de Misrata, a terceira principal cidade do país — pode também dar um novo incentivo ao executivo recém-formado sob os auspícios das Nações Unidas. O governo de unidade nacional é uma tentativa por parte da comunidade internacional de pôr fim ao caos em que a Líbia está mergulhada.
A deposição de Khadafi em 2011 deixou a Líbia à mercê de um conflito militar interno. O foco de poder passou a estar dividido em dois governos rivais: um com sede em Tripoli e outro em Tobruk, no leste. Nenhum reconhece legitimidade ao governo de unidade, mas todos querem evitar que o país se torne num feudo do Estado Islâmico.
O líder do governo recém-formado, Fayez al-Sarraj, apelou “a todas as forças militares a se unirem face ao inimigo comum e a juntarem-se às forças vitoriosas”. Os Estados Unidos ponderam armar as forças militares leais ao governo de unidade, mas os riscos de enviar armas para um país onde a instabilidade impera são muitos.
Na Síria, as forças terrestres apoiadas pelos EUA cercaram a cidade de Minbej, ponto fulcral para a circulação e abastecimento dos territórios controlados pelo Estado Islâmico. Membros das Forças Democráticas Sírias, uma coligação curdo-árabe, cortaram na sexta-feira “a última estrada que ligava Minbej à fronteira turca”, confirmou à AFP o director do Observatório Sírio dos Direitos Humanos, Rami Abdel Rahmane.
Era através desta cidade, a cerca de 40 quilómetros da fronteira turca, que o Estado Islâmico assegurava o abastecimento dos seus territórios na Síria, em especial Raqqa, a “capital” do “califado”. Minbej funcionava também como porta de entrada e saída de militantes e foi por aí que os autores dos atentados de Paris e de Bruxelas entraram na Síria, garantiu o representante dos EUA na coligação internacional, Brett McGurk. Com a perda de Minbej, o Estado Islâmico não perde o acesso total terrestre à Turquia, mas as estradas secundárias que ainda controla são perigosas e de difícil acesso, diz o director do OSDH.
A ofensiva do FDS foi lançada no final de Maio e contou com o apoio dos bombardeamentos aéreos da coligação internacional liderada pelos EUA que tem atacado posições do Estado Islâmico na Síria e no Iraque. Foram tomadas 79 cidades e aldeias na região durante os combates que fizeram pelo menos 218 mortos, entre os quais 159 membros do grupo jihadista, 22 elementos das FDS e 37 civis, a maioria destes durante os raides aéreos, segundo o observatório.
Apesar da perda de território, o Estado Islâmico continua a realizar demonstrações de força e a espalhar a violência. Este sábado pelo menos 20 pessoas morreram após um atentado suicida junto a um templo xiita perto de Damasco.
Entretanto, a ajuda humanitária começa a chegar a algumas das cidades mais fustigadas pela guerra civil que consome a Síria há mais de cinco anos. Na sexta-feira chegaram a Duma, cidade controlada pelos rebeldes, 39 camiões com bens alimentares e não alimentares, incluindo medicamentos, anunciaram o Crescente Vermelho e a ONU.
Na véspera, a cidade de Daraya tinha recebido o primeiro carregamento de ajuda humanitária desde 2012, mas os bens não puderam ser distribuídos “por causa da intensidade dos bombardeamentos” da força aérea leal ao regime de Bashar al-Assad, disse à AFP um habitante da cidade próximo dos rebeldes.
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